Terra Madre 2004: Minhas Impressões

Publicado por em nov 1, 2004 em Blog | 0 comentários

Nossa, ainda nem acredito que participei deste evento tão incrível!  Tudo começou com um anúncio nesse mesmo jornal, quando eu, por um acaso, descobri que o Terra Madre iria acontecer. Publiquei aqui dizendo que algumas comunidades brasileiras estavam convidadas a participar. Numa noite de  sexta-feira resolvi entrar novamente no site e vi uma coisa que não tinha percebido antes: estavam pedindo voluntários!!! Imediatamente escrevi um e-mail, mas depois por telefone fui informada que escrevi com algumas horas de atraso, já que as incrições tinham se encerrado na sexta a tarde. No final deu tudo certo e uma semana depois fui aceita como voluntária.  Um mês e pouco depois,  4 dias após minha defesa da tese, estava embarcando para Torino (Itália) para participar do evento.

O Terra Madre foi o Encontro Mundial das Comunidades Produtoras de Alimentos. Foi idealizado e promovido pelo Slow Food. Foram 5000 participantes, de todas as partes do Mundo, representando 1200 comunidades. Foi a primeira vez que um encontro dessa formaocorreu, reunindo pequenos fazendeiros, pescadores, produtores, coletores, facilitadores. A maioria nunca tinha saído de sua própria vila, quanto mais do seu país.

Na cerimônia de abertura falaram Carlo Petrini (fundador e presidente do Slow Food), Miguel Altieri (Chile), Frei Beto (Brasil), Vandana Shiva (India). Gostei das palavras de Vandana Shiva, que não saíram mais da minha cabeça:

“Se isso fosse uma reunião de Agribusiness, todos os rostos seriam brancos e todos os ternos seriam pretos. Vejo tanta cor, tanta diversidade aqui nesta casa, que enchem meus olhos de esperança e felicidade.”

Durante o encontro muitas reuniões, workshops, sessões plenárias ocorreram. Nós assistentes não tínhamos muita idéia do que ia acontecer, e tenho a impressão de que os organizadores também não. É claro que haviam sessões programadas, mas a impressão é que havia muito espaço para o improviso, e foi isso mesmo que aconteceu. Os representantes das comunidades trouxeram material, alimentos, e se organizou uma grande exposição, com mesas improvisadas, toalhas no chão. Tinha tanta gente bonita, tanta coisa prá ver e ouvir, tanto alimento para experimentar. Provei quinoa do Chile, cacao, xarope de agave, mescal (do México), amaranto do Perú, queijo vegan do Líbano, tâmaras do Marrocos, farinha de batata doce, biscoitos de pequi, doce de buriti, castanha de baru (tudo do Brasil), queijos italianos, especiarias indianas, vários alimentos de várias partes da África.

Eram 7 línguas oficiais. Falei um pouquinho de Italiano, um pouco de Espanhol, bastante “Portunhol”, muito Inglês, e escutei muitas línguas diferentes. Como assistente, acabei sendo uma das acompanhantes das delegações do México, Chile, Bolívia, Azerbaijão, Armênia, Uzbequistão, Líbano, alguns Napolitanos. Ao todo eramos 5 assistentes e 300 delegados. Todos os participantes ficaram alojados ou em casas de família ou em albergues, e espalhados por toda a região do Piemonte.  Nosso grupo ficou em Pracatinat, há uma hora e meia de viagem de Torino, nas montanhas. Chegamos tarde na primeira noite e não deu para ver onde estávamos. Na primeira manhã a surpresa foi alucinante…estavamos rodeados de montanhas com picos nevados.

A delegação brasileira era a segunda maior participante, com cerca de 160 delegados. Fiz o possível para encontrá-los, mas em meio a 5000 pessoas, não consegui ver todos. Estive em um encontro sobre o projeto “Biodiversidade do Brasil”, onde o projeto bilateral Brasil-Itália foi apresentado e tive a oportunidade de conversar com muitos brasileiros.  Foi um momento bastante importante para mim, que estou fora do Brasil há tanto tempo e queria me interar mais do que está acontecendo. Foi interessante (e emocionante) ver os índios Krahô falando ao microfone sobre seus problemas.

Ainda estou digerindo tudo que presenciei durante os 5 dias do evento. Tanta gente, tantas culturas, tantas línguas, diversos alimentos, tanta cor, membros de países “ricos”, membros de países “pobres” e tantos problemas em comum: o direito a terra, os problemas gerados pelos tratados da Organização Mundial de Comércio (OMC), a fome em meio a tanto alimento, a biodiversidade, problemas ambientais, agricultura orgânica, repúdio aos transgênicos, a globalização e a perda dos alimentos tradicionais. Tenho a impressão de que, em meio a tantos problemas que foram discutidos, todos que participaram levaram para casa uma esperança, uma sensação de que não estão sós.  O que eu trouxe de volta para casa? Uma grande esperança, uma felicidade muito grande de ter tido a oportunidade de participar, e a certeza de que é realmente esse o meu caminho.

Para quem se interessou, tem mais informação:

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  1. Salone del Gusto 2010. | Alimento Para Pensar - [...] Em 2004 o Terra Madre aconteceu em outro espaço, e como eu estava lá como voluntária, só pude dar…

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